Saí de casa pela primeira vez em quase uma semana e deparei-me com um cenário angustiante. As árvores margeando ruas quase desertas e o comércio com as portas fechadas deram leve sensação de suspense, uma expectativa sutil de que algo estaria prestes a acontecer. Quem sabe uma daquelas plantas rolantes dos filmes de faroeste americano cruzando a calçada ou um zumbi apontando no horizonte a se arrastar… O relato pode ter até graça mas não é só brincadeira. O ineditismo da situação faz com que, não encontrando paralelos na realidade, o imaginário recorra aos parâmetros da ficção, de onde batalhas épicas sugerem o medo e a esperança de que um herói, o Chapolin Colorado, venha nos defender. Heroico, no momento, é se informar direito e há basicamente duas correntes concorrendo pela consciência do povo em meio ao limbo de incertezas, às quais reproduzirei da forma mais simplista possível, pois sou o cronista e não o repórter.
Uma diz: vamos ficar em casa porque a vida vem antes da economia; e a outra: vamos trabalhar, porque a economia também sustenta a vida. Eu cheguei à minha síntese pesando os dois lados na balança do coração e honestamente não estou apavorado e nem constrangido em fazer minhas corridas diárias pelas alamedas semidesérticas do Paraná. Na disputa de narrativas, não creio em santos nem em seres infalíveis, mas minha sanidade mental leva-me a crer em senso das proporções: confio mais nos Estados Unidos do que na China, vejo mais sinceridade no Bolsonaro do que no Bonner, e gostaria apenas de ver menos idosos pigarreando nas esquinas com seus cigarros de palha. Crianças, lavem as mãos, comam direitinho, respeitem os amiguinhos e acreditem: se Papai Noel está no grupo de risco, Papai do Céu resolve a situação: vai passar!
